Vende-se diploma para instrutor de trânsito

Controladoria pede mais R$ 540 para que candidato não frequente aulas; Resolução federal exige o comparecimento de, pelo menos, 75% em cada módulo do curso

O mau exemplo da compra da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) chega agora a quem ensina direção a novos condutores. Com facilidade, a reportagem de O TEMPO negociou a aprovação em um curso de formação de instrutores de trânsito sem precisar frequentar as 180 horas obrigatórias. O esquema foi flagrado na Controladoria Regional de Trânsito Sabarense (Contrets), em Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte.


FOTO: SAMUEL AGUIAR/O TEMPO
A controladoria, um prédio de pintura envelhecida, está localizada em uma rua movimentada de Sabará. Segundo funcionários, candidatos de todo o país procuram o local.

Para quem frequenta todas as aulas, o curso custa R$ 900. Mas aquele que não pode ou prefere não comparecer paga R$ 30 pela ausência em cada módulo. Como são 18 etapas, o valor acrescido chega a R$ 540, elevando o custo final para R$ 1.440.

Para comprovar o esquema, a reportagem foi até a sede da controladoria, em Sabará. Após o primeiro atendimento, o caso foi encaminhado ao professor João Pedro Martins, responsável pelo estabelecimento.

Dissemos que só poderíamos comparecer às aulas em três dos nove fins de semana de curso. Rapidamente, o professor propôs uma alternativa. Mas era preciso pagar R$ 360 além do valor inicial do curso. "Você será mais um profissional no mercado", expressou Martins (ouça abaixo o diálogo).

Legislação. As Controladorias Regionais de Trânsito (CRTs) são empresas privadas credenciadas pelo Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Em agosto do ano passado, o Denatran publicou a resolução 358, que atualizou a regulamentação para o credenciamento das entidades.
A partir de então, a abertura e a fiscalização de controladorias passaram a ser de responsabilidade dos Departamentos Estaduais de Trânsito (Detrans).

A nova resolução também definiu regras para a capacitação profissional de instrutores, diretores gerais e diretores de ensino de autoescolas. A determinação federal exige a frequência mínima de 75% em cada módulo, regra simplesmente ignorada pela Contrets.

Em nota, o Denatran se redimiu de qualquer responsabilidade. "Conforme a resolução 358, cabe ao órgão estadual apurar qualquer irregularidade e aplicar as penalidades", diz o texto. Informado sobre o esquema, a assessoria de imprensa da Polícia Civil não se pronunciou.

Biometria.O sistema de identificação biométrica aparece como solução para fraudes. Assim como já acontece em aulas de legislação e direção, os futuros instrutores também terão que colocar o dedo no visor ótico para comprovar presença. A portaria 4.117, publicada na última terça-feira e que regulamentou os procedimentos para cursos de mototaxistas e motofretistas, também estendeu a identificação digital para cursos de instrutores.

Profissionalização. A lei 12.032, de 2010, regulamentou a profissão de instrutor de trânsito. Entre os requisitos, a exigência de, no mínimo, dois anos de habilitação e um ano na categoria D. A regra - que, aparentemente, poderia diminuir a procura, pois antes era necessário possuir apenas a categoria da aula ministrada - não inibiu candidatos. De acordo com o Detran-MG, por mês, 1.200 pessoas tiram a carteira de instrutor no Estado.

Segundo a coordenadora de educação de trânsito do Detran-MG, Maria Cecília Lopes, um estudo está sendo realizado para a abertura de mais controladorias. Hoje, são oito. Para ela, o próprio mercado dos centros de formação de condutores saberá separar o bom do mau profissional. "As autoescolas precisam manter um índice de aprovação de 60% para manter o registro. As controladorias são como faculdades, responsáveis pelos cursos que ministram".

Confira o áudio da negociação: